terça-feira, 16 de dezembro de 2014

Fique um pouco

     Refaz o momento recente, que me lembra você longe do meu coração. Desfaz o momento presente, que me faz esquecer como deveria ser. Porque se for para eu ficar, eu fico. Nem que me peçam, eu não vou embora, pois já tenho tudo que preciso aqui. O que for para dizer, eu digo. Só não digo que passou da hora, o que importa é você comigo aqui. Vem cá, deixa o teu sorriso me mostrar, que seu mundo é mais vivo quando está com o meu. Vem cá, deixa o meu caminho te encontrar, e perceber o paraíso bem nos braços teus. Então, não enrola, fique um pouco, porque chora lá fora mas não vai demorar.

quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

Orgulho

     Você sabe que nada de especial tem nesse lugar. Não tem vela, não tem beijo, não tem luz, nem desejo. Escuro, umedecido, nublado, sem perigo. Não encontro a entrada, mas se entro sei que não tem saída. Intrigante, pois da paz que paira no ar, instaura-se dentro de mim a fervidão, e lá se vai a minha paz. Realmente, nada de especial tem nesse lugar. Não sei se fico ou se corro, talvez eu abrace, mas vai que eu morro. E por falar em morro, eu já subi em vários, cansaram-me o bastante, mas não tanto quanto aqui me cansa. Falta-me ar, até esperança. Encontro a vela, mas me falta fogo. Se tomo ar, cadê meu fôlego? Se deito ao chão, cadê meu abraço? 
     Aqui me falta tudo, até de tudo que me cansa, pois eu gostaria de me cansar com algo diferente que não seja estar aqui. Sinto-me preso feito estaca, como cortar uma cana sem a faca, ou cair de um abismo, assim, de repente. Esse lugar me faz mal, faz de mim alguém diferente, faz-me abrir uma porta inconsequente, dar dois passos a frente, ver um mundo dormente, olhar para trás e querer voltar. Eu não pertenço a esse lugar sombrio, que dos frutos só se colhe discórdia, afasta a luz que se planta lá fora, ensurdece o ser já emudecido, que das palavras diria uma só, seria um adeus bem afogado, das águas pálidas de um riacho que deságua em mim e me molha inteiro. 
    Eu não pertenço a esse lugar, sinto muito. Esse lugar pode até me pertencer, pode até fazer parte de mim, mas eu não pertenço a esse lugar. Esse lugar se chama orgulho, meu leão selvagem e faminto, protetor impotente e desalmado, sem cura, sem coro, apenas covarde. Um lugar dentro de mim já desabitado. Não dou estadia a ninguém nesse lugar. Se nem eu quero em meu orgulho habitar, como a outrem eu poderia permitir?  Esse lugar não tem nada de especial, então por favor, não deixe ninguém em seu orgulho habitar, prefira morrer de fome a um olhar vazio se deparar. Se alguém te machucar, dê mais um chance, vai que mais adiante, em um momento suplente, a alegria não se faz presente? Então, dona Maria, não me venha com seu orgulho!

domingo, 7 de dezembro de 2014

Definindo saudades

     Nem tudo é você. A maré que seca no amanhecer não é você; o céu estrelado após um dia de trabalho, descansando ao relento no orvalho, não é você; a água da chuva que bate em meus cabelos, escorrega pelo meu rosto, deixa-me de molho, escaldado feito bobo, não é você; o sol que me aquece, tão quente que a chaleira até ferve, esquentando a pele feito febre, não é você; o vento que bate a minha janela, fazendo o barulho ensurdecedor, zumbido que causa até pavor e incomoda quem está ao lado dela, não é você; a música que toca ao meu lado, ás vezes no rádio, às vezes no computador, ou seja lá onde for, não é você.
     Realmente, nem tudo é você. Mas sinto que tudo tem você. Pois eu sempre te vejo quando eu me acordo e olho no espelho; quando abro a porta e a sala está vazia, no começo da tarde ou no fim do dia; quando eu fecho os olhos e adormeço, às vezes sonho contigo e às vezes me esqueço; quando me sento na mesa de jantar e estou sozinho, com o coração cheio e o prato vazio; quando escrevo um verso, mesmo que sem nexo, se ele tem você, fica fácil entender.
     Eu me entendo facilmente, só é difícil aceitar. É difícil aceitar que você esteja em todos os lugares, mesmo que eu não possa te tocar. Você bem que poderia se fazer presente, e de presente ser dada a mim, pois assim eu te desembrulharia e te tinha por inteiro. Nada mais de tudo ter você e eu não te ter. Já que nem tudo é você, então que você seja algo para mim, seja um momento condizente com o que vejo e pertinente com o que sinto. Por fim, seja um momento passageiro, mas que passe por mim o tempo inteiro.

segunda-feira, 24 de novembro de 2014

Até você

     Não se faz mais nenhum segredo, já não tenho medo de me entregar. Encontro paz quando eu te vejo, é daquele jeito que só você faz. Quando eu te vi, pela primeira vez, eu soube dar o valor que você me deu. Na praia e você ali, com o sol no amanhecer, a vida me mostrou o primeiro passo que eu tinha que dar para te mostrar: que em partes, quando um coração distante olha em sua direção e faz eu me mover até você, é porque tinha que ser.

domingo, 23 de novembro de 2014

Correspondência

     A correspondência que eu te escrevi chegou? Era noite, agora é dia, então veja a minha alegria de saber que eu finalmente consegui te escrever. Foram meses apenas olhando seu retrato que preguei na geladeira. Era esse retrato que fazia eu me perder todas as manhãs, quando eu ainda estava com sono, não liberto dos sonhos, então eu abria as asas e começava a voar. Era um sonho meio que fora do foco, meio que sem destino e sem meio, partia do sul ao norte sem norteio e acabava desnorteado. Eu virava um anjo pacífico e pálido, nascia no mar do atlântico e morria no ártico, com minhas asas cortadas após o primeiro gole de café. Agora é vida normal, é vida que segue. Tenho alguém me esperando na sala, alguém que me acolhe a noite e me liga à tarde, às vezes já meio tarde, e às vezes nem me liga. Quando termino o café, organizo meus horários e sigo meu dia. 
     Porém eu apenas gostaria de saber se minha correspondência chegou. Na verdade, gostaria mesmo que tudo que estou pensando agora entrasse por um tubo e fosse direto a você, que você checasse suas cartas, lesse o que eu te escrevi e me respondesse algo. Ou melhor, se fosse assim, tudo seria mais fácil. Acho que nem precisaria te escrever carta alguma, porque se você pudesse ler os meus pensamentos, saberia de tudo que está guardado aqui dentro e entenderia o que sinto por você.

domingo, 9 de novembro de 2014

Sobre ela

     Eu mergulhei fundo em um sonho profundo no silêncio da noite, deitado ao seu lado, mar de céu estrelado que reflete seu olhar, no suave desejo de estar nas memórias de uma fotografia. Ela me une a seus braços, o elo perdido que faz eu me perder. Eu que vivo em outro mundo, uma outra realidade, onde os livros não dizem tudo, apenas a mais pura verdade. 
     Encontro-me, agora, entre dois mundos, o meu e o dela, um beco e uma viela, um beijo e um aperto de mão. Ela abriu seu coração, e eu estou aqui tentando conquistar a confiança dela, sem pressa, sem medo e sem preocupação. Pois eu tenho ao meu lado uma garota tão linda, que nem ela tem essa noção. Ela não se acha muito interessante, e eu acho interessante ela se sentir assim, porque se isso fosse verdade, o que eu estaria fazendo aqui? 
     Você já teve a impressão de que o mundo lá fora parou e só o seu continuou? É mais ou menos isso que eu sinto quando eu estou com ela. Nada mais importa, porque já me importei o bastante. Hoje eu apenas bato a porta, seguro a mãe dela e a peço para que eu seja o primeiro: aquele que a faça entender que para dois estarem juntos, ambos precisam se encontrar inteiros; que a faça enxergar um mundo o qual ninguém até hoje conseguiu; que a faça sentir algo que ela achava saber existir, mas nunca sentiu; que esteja ao seu lado a cada momento importante, a cada momento difícil, pois se for difícil, que eu me esforce para o tornar fácil; que possamos compartilhar os nossos momentos de felicidades, ou aqueles não tão felizes, dos aprendizados, dos fracassos, e que na dor eu a dê amor. 
     Pode parecer audacioso de minha parte, mas eu sou assim, eu vivo no topo do mundo, e é difícil alguém me fazer descer, eu só desço se for para buscá-la, para que então possamos subir e crescer. Por isso eu a peço que eu seja o primeiro, porque eu sei que temos muito o que viver. E eu não estou sendo sonhador, apenas tenho confiança no que sinto.

segunda-feira, 27 de outubro de 2014

Escancarei a minha porta

Já bateram muito em minha porta
Mas nunca deixei ninguém entrar
Eu apenas soube que era a hora
Quando eu te vi na rua a passar

Escancarei a porta, a sua espera
Mas parece que não adiantou
Você ficou plantada, austera
Gritei seu nome, você entrou

Passos rápidos, sem dar bom dia
Nem olhou em meus olhos, serena
Sentou-se ao sofá, sem muita pena
Convidou-me a sentar, meio tardia

Eu senti seu medo, logo no começo
Sua dificuldade em me olhar no olhos
Mas mesmo você com esse medo
Alcançou a ternura do meu coração

Surgiram suas primeiras palavras
E delas eu tentei criar minha condição
De puxá-la pelo braço até meu corpo
Para conseguir te ouvir com exatidão

Nasce, assim, o canto que se faz desejo
Atrelado em seu peito, a flor do cortejo
Tirada de meu bolso e dada com carinho
Para que eu possa encontrar seu caminho

Rapidamente entardeceu e se fez noite
Você olha o relógio e diz que tem que ir
Mas o importante é foi dado um passo
Para que eu te faça, cada dia mais, feliz 

segunda-feira, 20 de outubro de 2014

Um reencontro

    Quer saber? Sim, você acorda em mim, irrita-se com a luz do sol em seu olhos, diz que ainda está cansada, manda que eu feche a minha porta, pois deseja voltar a dormir. Mas, querida, não dá. Minha porta é aberta para o mundo, um mundo que você conhece de outras vidas. Conhece a cada beco, brejo e birra. Então amanheça, pois o dia já amanheceu, e eu já estou acordado há um bom tempo a sua espera, até preparei o café. Eu já me arrumei, estou bem, bem com você aqui dentro. Chegou nosso momento, resplandeça, e reabite meu mundo, veja as flores lá fora, eu as plantei para você. Caminhe até a praia, tome um banho de mar, perca-se nesse horizonte azulado e depois venha me encontrar. Largue mão dessa preguiça, e nem adianta fazer bico, pois eu sei que você não é autoritária. E é disso que eu estou falando, falo de sua simplicidade, da sua ambição sadia, eu vejo isso em seus olhos e nesse seu sorriso tímido. Talvez você não queira ser incomodada, mas essa sua quietude incomoda minha inquietude. Ainda é cedo, concordo. Mas ficamos muito tempo afastados, temos muito o que conversar. Então, por onde vamos começar?

domingo, 5 de outubro de 2014

O homem de um terno só

     Em torno do tempo, ele ainda conta as horas. Parado na estação de trem, ele se sente estranho, meio perdido, não conhece ninguém da região. Afirmo isso porque conheço a todos, a todo momento e de todos os lugares. A aflição dele me trouxe uma ternura, por vezes passava a mão na testa, por vezes olhava para o chão e resmungava, mas tentando se passar despercebido. Resolvi ir cumprimentá-lo, não acho certo deixar as pessoas desacolhidas, quando no fundo tudo que elas precisam é de um sorriso. 
     Ele foi bem receptivo, logo tentou disfarçar a preocupação, abrindo um sorriso, mas a inquietude das pernas falavam por si só. Não me demorei, logo me adentrei à suas preocupações, e ele não pareceu ter nenhum problema em expor toda a situação. Era um problema muito simples, mas ele teve a destreza de complicar: um homem, seu único terno, e duas mulheres. Ele tinha uma entrevista de emprego logo mais tarde, em uma cidade ao lado, e tinha apenas um terno para vestir. Ele queria ir bem vestido, mesmo não precisando, pois, assim, a entrevista não exigia tanto compromisso com as vestes. 
     Até aqui, nada realmente parece ser um problema. Convenhamos: a entrevista já está marcada; ele já tem um terno, mesmo não precisando dele. O problema está em um erro que ele cometeu, ele tem duas mulheres e nunca soube lidar com isso. Em resumo, Sárime é a mais antiga, a que mais proporcionou experiência para este jovem, uma jovem humilde financeiramente, mas que buscava crescer como pessoa, mesmo sem saber por onde começar. No outro lado, Elvivi era a que ela mais se identificava, uma menina inteligente, da alta sociedade, rodeada por vários amigos, mas que sempre fugia de algo mais sério, tinha uma desculpa para tudo até das coisa que ela omitia. As duas se conheciam, sabiam que esse jovem já teve um relacionamento íntimo com ambas, mas também pensavam que só a amizade foi mantida, o que era uma mentira. 
     Esse jovem, Theobaldo, conseguiu levar essas duas por um bom tempo, mas a cada momento elas cobravam mais e mais da presença dele em suas vida. Assim que Theobaldo ficou sabendo da entrevista, comentou normalmente com elas, e disse que o único problema é que ele não se sentia confiante com o terno que ele tinha, ele achava meio velho, achava também que quando saia na rua os outros homens o olhava com piedade, daí que cada uma delas, em momentos diferentes, prontificaram-se de arrumar um novo terno. É de se entender que ambas queriam agradar o parceiro. Theobaldo ficou feliz, agora passaria a ter mais dois ternos, e novos. Poderia sair pela rua sem se preocupar com o que os outros iriam dizer. 
     Tudo parecia estar perfeito, e deveria ser assim. Um dia antes da entrevista, Sárime foi a casa de Theobaldo pessoalmente entregar o terno. Ela, por ser mais humilde, que costurou. Ela não tinha dinheiro, mas tinha a capacidade para fazer. Theobaldo, logicamente, ficou agradecido, porém internamente sentiu um certo preconceito. Theobaldo achava que por não ser feito por um alfaiate reconhecido da cidade, o terno teria algum problema, e não ficaria tão apresentável. Mas como ele ganharia outro terno de Elvivi, ele nem se preocupou. Porém, cai entre nós, Theobaldo me mostrou o terno de Sárime, e eu achei impecável, o problema estava realmente na cabeça dele. 
     Enfim, Sárime, antes de sair, falou que iria à estacão antes de Theobaldo embarcar, e que ela gostaria de ir até a cidade da entrevista para fazer companhia, já que ela tinha algumas coisas para resolver por lá. Theobaldo me disse que isso é o que ele odeia nela, uma pessoa controladora, disse que ela não tinha nada para resolver na outra cidade, apenas inventou isso para fiscalizar o que ele anda fazendo, mas ele na hora não disse nada, com medo de magoá-la, um "tudo bem" foi o máximo que pôde expressar. 
     Algumas horas depois, bate a porta de Theobaldo, um garoto avisando que dona Elvivi pediu que ele passasse na casa dela antes que ele partisse, para pegar o terno que ela mandara fazer, pois Elvivi já tinha ido mais cedo ver umas amigas, e por coincidência era a mesma cidade da entrevista, então ela iria depois o esperar na estação. 
     Mas, veja só que situação, eu estou, agora, exatamente frente a frente, na estação da cidade a qual ele terá a entrevista, ele acabou de chegar, apenas parou porque Sárime precisou ir rapidamente ao banheiro, e Elvivi está prestes a chegar. Agora tudo fez mais sentido. Theobaldo, então, diz - aqui estou eu, 10 minutos para minha entrevista, três ternos na mão, e dois problemas que estão prestes a acontecer - e nada parece melhor, vendo Theobaldo aqui ao meu lado, não consigo entender como ele conseguiu ser tão passivo a todo esse tempo. Quando eu vejo que o tempo está se esgotando, digo as últimas palavras antes de tomar meu rumo:
- Theobaldo, você é um homem de um terno só. Você momento nenhuma precisou de um novo terno. Você apenas acha que precisa. Mas seu maior erro, é não ter controle das situações que lhe rodeiam. Você veio para cá para essa entrevista, e você precisa muito disso. Você deveria estar tranquilo, sem nenhum problema, para que você possa ter um maior lucidez e discernimento, mas você se sabota a cada momento, por não saber lidar com seu emocional e não ter a atitude de homem. Vista seu velho terno, e vá sozinho para a entrevista, que é o que realmente importa, você não precisa de um terno novo e nem da companhia de alguma delas para que os outros o vejam como homem e o reconheçam. Reconheça você como ser integrante de um todo, isso será o suficiente. Se alguma delas se entristecer porque você as deixou de lado nesse momento, não tenha medo. Porque quem é de verdade, permanece de verdade em nossas vidas, independente de nossas decisões. E quando chegar a noite, e você se sentir desolado, converse comigo, e apenas me peça uma coisa "Deus, sare-me de tudo que eu vivi".

quarta-feira, 1 de outubro de 2014

Mais uma vez você

Você toma meu tempo
Me faz sorrir fácil
Me entorna o embaraço
Apenas, assim, do seu jeito
A sobrepor meu desejo
E diferir meu pensamento
Ao Interromper meu momento
Eu fantasio o que quero ter
Pois eu te quero aqui ao lado
Em um abraço apertado
Daqueles que eu sinta
Que você não vai embora
E eu não precise das horas
Para saber se você tem que ir


quinta-feira, 4 de setembro de 2014

Deu-se partida

     Eu já perdi a paciência, que desvai em essência tudo que está arraigado em mim. O perfume suave, tecido de ceda, pode ser que não se perceba, mas eu sei que meu mal se deu partida. Em pleno disfarce, na pele macia, olhar profundo, eu sei que em qualquer lugar do mundo, o céu se enche e o mar se esvazia. Pingente único, perolado, no ouro se é forjado, e sobre o peito o manto é feito, mas não se tem efeito, não seduz, não mais fascina, perola azul piscina, os contos de fadas me encantam, mas nada me ensinam. Ela foi embora, deu-se partida, nem rastros no chão deixou. Porém, um tanto obstante, aqui me vou, rápido e rasteiro, dos cacos jogados fazendo um inteiro, de um emaranhado de fotos, uma coleção. Meu mal finalmente se deu partida, depois de tantas idas e vindas, eu ainda guardo as marcas no colchão.

sexta-feira, 29 de agosto de 2014

Nosso maior erro

     Na nossa sociedade atual, onde os paradigmas são pregados na parede, você adquire concepções inadequadas que refletem na sua vida. Em determinadas situações, você se depara com o medo de errar, o medo de que possa ser um desperdício, medo das consequências que tal situação pode te trazer. Então você prefere desistir, mas acaba cometendo o maior erro, o erro de não tentar. Não adianta pensar que todas as escadas de sua vida serão escadas rolantes, se você não der um passo a frente, esqueça, você não sairá do lugar. O ser humano tem um potencial incrível, mas também tem um incrível potencial de apenas sonhar.  Se o sucesso é eminente, há um domínio claro que o fracasso é evidente, só que não deveria. É de se entender que a possibilidade de haver uma perda pode ser muito prejudicial, há limites para tudo nessa vida, mas não se limite a tentar mensurar até onde você pode chegar. Algumas coisas são óbvias, e o que não for, erradique. Temos tanto a aprender, que até mesmo um erro se torna um acerto diante da magnitude do aprendizado, da vivência em essência. Não aceite ser uma nuvem passageira, seja a tempestade, seja a chuva que rega e rejuvenesce por onde passa. Deixe marcas.

sábado, 23 de agosto de 2014

Meus momentos

     Eu tenho meus momentos, eu tenho meus vários momentos. Por isso, em determinados dias, eu desligo a luz do quarto, ligo o rádio, escolho a música mais triste, deito na cama e fecho os olhos. Esse é meu melhor momento. A partir daí, imagens começam a passar pela minha cabeça, as melhores imagens possíveis, ou as melhores cenas, o espetáculo da vida, aquela que eu imagino ser realmente feita para mim. Isso me traz uma sensação de liberdade, de longevidade, tudo fica tão pequeno perto de mim. Essa sensação me traz um arrepio, um aperto no peito, na maneira mais positiva, do âmago resplandecendo, surgindo aos poucos, algo surreal. 
     Faço isso sempre que preciso, quando me sinto perdido, ou preso em algo do passado, que de tempos em tempos, remói-me por dentro. Há de se entender que no meu íntimo está tudo bagunçado, e minha vida é tentar organizar, porém, não vejo tarefa mais difícil. Eu começo tentando saber por onde começar. Depois sigo tentando saber por onde seguir. Em seguida, eu acabo entendendo o que eu achava já entender, o que me leva a pensar que posso estar errado, então eu volto ao começo, agora sem saber como recomeçar. Surge a aflição, tristeza no peito. Por mais estranho que pareça, isso me faz um bem tão grande, porque eu sei que, independente de qualquer coisa, de qualquer impressão, de qualquer pensamento negativo que eu possa ter tido, apesar de qualquer sensação de fracasso, eu dei um passo adiante. Mesmo que tenha sido um pequeno passo, ele foi grande só por ter sido para frente, pois o meu maior medo é ficar parado.
     Meu quarto ainda está escuro, a música ainda está tocando, mas a energia que me rodeia está completamente diferente. Sinto-me melhor a cada segundo. Pois não importa o que te abala por dentro, não importa o que te deixa infeliz, não importa o que ou quem te faz mal, é tudo passageiro, é apenas um momento, dos vários momentos. Logo depois você vai se perceber sorrindo, vai se perceber melhor. Mesmo que você não tenha conseguido resolver os problemas que ontem te abalavam, se encontras a paz dentro de ti, terás uma nova visão de tudo, e junto de novas visões, temos novas soluções, talvez um problema resolvido, por que não?
     Eu reconheço que hoje eu vivo isso, reconheço que tenho dentro de mim um velho sentimento, um velho sentimento disfarçado de novo. Já habitou em mim tantas vezes, e ele sempre vem de maneiras inesperadas, pegando-me de surpresa. Mesmo que isso me faça mal, por não saber lidar com essa situação, com esse sentimento, eu sei que tudo se resolverá. Talvez da maneira que eu espero, talvez não. Isso realmente não importa, pois quem bate a minha porta, se não implora, não me rega, e se não cresço, não dou flores, não crio amores, não espalho o fruto. Pois para o bem de quem não me intimida, no mais vasto do meu íntimo, com um suspiro rasteiro, de mãos quentes em meu peito: se não me encontra, não me habita. 

segunda-feira, 18 de agosto de 2014

Foi um engano

     Bateram a porta de minha casa logo cedo, mas foi apenas engano. Logo mais, meu telefone tocou, fiquei surpreso, meu coração palpitou, ensaiei infinidades de diálogos, e quando fui atender, apenas mais um engano. Percebi que aquele não era meu dia, como os outros também não foram. Eu sempre me enganando, criando expectativas, que surgem de nem sei o que, talvez para suprir a falta de algo que eu também não sei o que é. Tudo um engano. E isso cansa. Eu canso de sempre cair na mesma rede. Não é nada novo para mim, mas mesmo assim, vejo-me nas mesmas circunstâncias que ontem eu não achava mais possível vivenciar. Mas eu vivencio, e muito fácil. É um mundo dentro de mim que não tenho controle, e acredito que ninguém tenha. São os desejos que surgem, e não nos contemos, mesmo que depois, quando paramos para pensar, vemos que foi um erro, que tudo podia ter sido diferente. Então dizemos "depois dessa eu aprendi, é passado, bola pra frente", a bola rola, e como rola, rola rápido e para frente, mas bate na parede e volta tudo de novo. 
     Ok, estamos aqui mais uma vez, a diferença é que estou conformado, essa é a única diferença, porque eu sei que continuarei criando expectativas, criando um mundo em minha volta, revisitando o mesmo sonho, e isso faz parte, eu tenho uma imaginação fértil. Então eu me dou conta de um paradoxo: minha imaginação me faz viver, me faz querer, a cada dia, viver esse esplendor que Deus me proporciona, mas ao mesmo tempo, ela cria em mim o maior dos enganos, o maior dos erros, cria a expectativa, a projeção. 
   Mas no fundo eu ainda acredito, sempre na esperança de que eu posso estar errado em não acreditar, ou seja, o engano está em toda a parte, e eu já me conformei com isso. É um aprendizado tão simples e glorioso. Eu aprendi que Deus quer que eu seja paciente, quer que eu olhe adiante, que eu seja transcendente. O agora já passou só de eu escrever essa última palavra, é a arte do engano de achar que se enganar é ser ingênuo, sendo que ser ingênuo é não acreditar. E eu acredito, até a última gota dessa chuva cair.

terça-feira, 29 de julho de 2014

As estrelas

Precisa-se da escuridão para se ver as estrelas
E é uma das vistas mais belas que se pode ter
Uma mar sereno e pacífico beirando sobre mim
Intocável aos meus dedos, mas não ao coração
Porém, no final de tudo que me vem a surpresa
Não é a escuridão a responsável pela paisagem
E sim o brilho da luz que não se pode apagar

Carta de Elisabeth

     Ela voltava do trabalho cansada, estabanada, enrolava-se toda tentado achar a chave para abrir a porta em sua bolsa de grife que contêm meio mundo, pois a outra metade ela esqueceu em casa. Antes de entrar em casa, ela se vira, olha a vizinhança como se estivesse procurando algo ou alguém, com um olhar esperançoso, boca entreaberta. O cerrar dos lábios foi a aflição, como se não tivesse sido daquela vez que ele acharia o que procurava, mas teria dias a frente, interminável espera. Último ato é o alisar da franja na emissão de se virar e entrar em casa.
     Tarde da noite, deitada na banheira, pensando em seus problemas, mas são problemas tão pequenos, daqueles que se resolvem por si só que nem valem o esforço. Ao sair do banho, ela prepara algo rápido para comer, uma xícara de café, senta-se a mesa, sozinha, e é só nisso que ela consegue pensar: sozinha. Ela e um jazz kind of blue de fundo, que entristece mais ainda. Sente-se cansada, mas não o suficiente para dormir, mas o bastante para deitar-se ao sofá, ligar a TV para ouvir algo ao mesmo tempo que folheia uma revista. Revista de moda, ela gosta disso. Ver aqueles vestidos de festa, longos, bem encaixados, exuberantes, a faz imergir para um outro mundo, outro lugar, outro momento. Algo mais animado, mais sociável, mais barulhento, barulho de gente que conversa, risos e sorrisos, taças que brindam, com aquela música suave de fundo, o barulho ideal para uma boa noite.
     Quando ela cansa de sonhar, reabita o mundo real, pega o controle, muda o canal, vê o jornal. É sempre importante saber o que está acontecendo lá fora, porque ali dentro nada acontecia. Ela até pensa as vezes em comprar um cachorro para ter alguma distração, algo para reclamar, aquele xixi no lugar errado, aquele sapato mordido, móvel da sala arranhado. Ela pensa demais, talvez esse seja o problema. Pensou tanto que deu sono. E dormiu. No outro dia, assim que acordou, ela resolveu agir, então escreveu essa carta, tentando mostrar o que ela sente falta, tentando mostrar que esse algo é você.

segunda-feira, 28 de julho de 2014

Poema da moça bonita

Encontrou com o desejo de perder
A usou com o desejo de vencer
Atribuiu apenas querendo tirar
Sucumbiu dizendo o que é amar

Jogou fora o que não foi embora
E não joga o que lhe convém
Aos acordos que os façam agora
Prometendo de tudo, menos o que tem

Fala bem, tom alto e rígido
Fala até o que não queria ter dito

Hoje aperto a mão e digo: adeus!
Falo com simpatia para socializar
Digo: bom dia, como vai lá?
Pois dos enganos, desfaço dos seus

Aprecio a lei da causa e efeito
Por isso tudo que faço é com respeito
Mas essa lei me vem a falhar
Pois tenho um mundo a me desrespeitar

Mas ajo no meu ensejo
Esperando tudo que desejo
Agindo sempre com a verdade
Buscando, nos cantos, sinceridade

domingo, 27 de julho de 2014

Ainda sinto na pele

É o frio do inverno tocando a pele
E a indecisão cortando a garganta
Uma árvore que nasce e não cresce
Quebra-cabeça que se desmancha

Ao vento que sopra e esclarece
Maré de sorte assim que emanta
Abraços fortes ao som da prece
Do nosso senhor, a esperança

Na chuva que cai e prevalece
Centelha que surge e descansa
O pano que cobre e aquece
Semeadura de boas mudanças

Ao lado da luz que envolve
Aquele que ver e não esquece
Ainda ao mesmo som da prece
Ao mesmo som que nos move


Um velho hábito

     Não é a primeira vez que fico paralisado. Eu a vi subindo a ladeira, na primeira marcha, quase parando. Faltava força, faltava ar, faltava tudo, até mesmo amar. Apenas olhei. Faltou-me coragem, como na primeira vez. Aquela sensação de nervosismo voltou, há muito tempo que não sentia isso. É como relembrar um velho hábito que eu tinha com você ao lado. Eu queria poder te dizer 'oi', mas enquanto não consigo, irei escrevendo tudo aquilo que não digo. Infelizmente não tenho coragem de escrever tudo que sinto, faz-me sentir mais idiota, não querendo escancarar a porta de casa para não ter convidados indesejáveis. Talvez eu perca esse medo, o mesmo medo que é o de te perder, mesmo tendo te perdido há muito tempo. Talvez você não saiba, mas através da minha janela eu consigo te ver. Eu sei que aquela luz no fim do mundo é o da sua casa, essa luz mantém o que eu achava estar morto há muito tempo, mas, para minha surpresa, estava apenas adormecido. E agora eu não sei se é um sonho ou um pesadelo que eu estou prestes a ter essa noite. Não quero mais a assombração da sua ausência. Eu quero seu aroma, e o frio na barriga que sua voz me trás. Queria poder trazer frases novas paras meu textos, não mais meus velhos hábitos falhos. Queria uma roupa nova e um fim de tarde. Apenas acordar no anoitecer e caminhar na praia. Mas tudo está parecendo tão incompleto. Talvez agora eu saiba porque eu dou tantos 'nãos', talvez eu ainda guarde o seu 'sim'. O 'sim' de 'eu te quero', o 'sim' de 'você me faz falta'. Porém isso tudo pode ser que seja apenas a brasa quente ou uma faísca: uma lampeja e logo vai embora, a outra só apaga quando amanhece, pois já tem a luz do sol para iluminar o dia.

terça-feira, 1 de julho de 2014

Mais uma vez

     Encosto a minha cabeça no canto da parede. Sinto a música vibrar pouco a pouco em meus ouvidos, descansando meus pensamentos, almejando o parar das horas. O meu tempo é o agora. Minha luz é Deus que conduz. Sou, agora, paciente. Abro um sorriso e minha mente, assim consciente, e deixo a paz acalmar meu coração. Durmo. Amanhã cedo quando eu acordar será um sorriso que verei em meu rosto. Descobrirei, mais uma vez, o que se passa em minha cabeça. Entenderei as minhas fraquezas e os motivos das lágrimas que caem de meu rosto. Após o café da manhã eu lerei uma notícia boa, irá arrancar de mim um sorriso. Aproveitarei o momento e lerei uma anedota no jornal; planejarei o que fazer do meu dia, e me perguntarei o que eu achei sobre isso. Antes de sair para o trabalho eu me lembrarei, mais uma vez, para não querer agradar aos outros antes de agradar a mim mesmo, mesmo sabendo que isso terá pouco efeito. E me desejarei, assim, mais um ótimo dia.

domingo, 29 de junho de 2014

Ao nosso tempo

Eu queria poder te dizer muita coisa
Mas nem sei por onde começar
Será que eu começo pelo erro
Ou o acerto que foi te encontrar

Olha só, não estamos tão distantes
Assim quanto mais adiante
Nos próximos instantes, certamente
Você terá de mim um olhar diferente

É tudo apenas uma questão de tempo
Esperar que chegue um certo momento
Para que nosso tempo decida parar

Mas que ele pare enquanto for cedo
Para que aproveitemos o ensejo
De ter um sol a nos iluminar

quarta-feira, 25 de junho de 2014

Joana

     A água bate em seus pés, Joana, e você acorda. A maré volta a encher, já é fim de tarde. Não importa mais o tempo que passa, nada mais importa. Hoje você percebe que há vida em seus olhos, que todos os erros cometidos te levaram a ser quem você é. Você viveu tanto a vida que eles queriam, e finalmente você vive a vida que você quer viver. Ninguém mais escreve em seu diário. As lágrimas que caem nas páginas são suas, são legítimas. Você sofre por seus amores, você aprende com suas dores, voa com suas asas, caminha na areia da praia, dança em frente ao espelho, abraça um mundo que agora é seu. É bom vê-la não mais lamentar pelas situações incompreensíveis em que a vida te colocou. Pois esse é o Karma, certo? Temos, em tempos, que nos submeter aos mistérios do desconhecido para nos conhecer. Muitos vêem isso como pagar uma dívida, saldar esse Karma negativo. Eu apenas vejo tudo isso como uma oportunidade. A vida tem dessas de nos oferecer a chance de fazer o certo, mesmo que estejamos errado. E de tantas as oportunidades que nos são cedidas, de tanto aprender com os joelhos calejados, na dor, no amor, na tristeza, na frieza, na certeza, ou qualquer sentimento que seja, você passa a não mais ganhar essas oportunidades, você agora é apto a criá-las. Você passa a ser livre, essa é a benção: ser condizente e consciente com o que o futuro tem a nos oferecer. Isso te faz grande, Joana, mais forte, determinada e abençoada, você já percebeu isso, certo?  Então, Joana, como é ser livre? Encontrastes a plenitude ai do lado de fora? O céu é tão estrelado o quanto dizem? A vida é mesmo bela, não? Eu espero que sim. Por fim, escrevo-te apenas por memória, quero que saibas que estou bem, e estarei sempre ao seu lado, o quanto que possível, das mais diversas maneiras possíveis. Deus te abençoe, Joana.

domingo, 11 de maio de 2014

Em um dia de chuva

Nasceu diante a um dia de chuva
Bateu a porta de maneira oportuna
Escondeu o véu assim que me viu
Aos choros e prantos o sol acudiu
Infame escorrer de olhos o da ilustre
De cima a baixo assim que me esculpe
Terno de linho que tu veste amassado
Um semblante gentil de tom afagado
A marca da poeira em seu calçado vil
Adentras meu recinto a fim de estio
Assemelha meu prato a fome que passa
Serve-se de cunha sua refeição escassa
Cobre-se, então, com a noite que chega
Ao canto da sala e um lençol de seda

sexta-feira, 9 de maio de 2014

E por fim

    Foram três abraços: um de educação, outro de carinho e, por fim, um de adeus. Durante esse tempo houve três olhares: um de curiosidade, outro de alegria e, por fim, um de solidão. As palavras trocadas foram muitas, mas apenas três frases marcaram "prazer em te conhecer", "eu o amo" e "hoje, eu preciso ir". De todos o lugares que visitamos, três viraram fotografias em meu pensamento: você sentada na festa do João Carlos, seu sorriso ao receber uma ligação de seus pais e, por fim,  o embarque no trem, com seu olhar de solidão, dizendo que você precisava ir, após tanto eu te pedir para ficar. Eu sei que seu pai tinha falecido, que você tinha que passar um tempo com sua mãe, que você se sentia muito sozinha aqui na cidade grande, longe de todos seus familiares e amigos. Eu sei que você largou seus sonhos por mim, por nós. Eu sei o quanto você sofria de tanto ficar sozinha naquele apartamento, enquanto eu passava o dia no trabalho, você sem amigos, sem perspectiva, sem ninguém. Hoje eu sei que eu não estava ali. Eu sabia também que tudo se resolveria, era passageiro, depois de um tempo você voltaria, até planejava trazer sua mãe contigo. Eu só não sabia, meu Deus, da tragédia que estava por acontecer, que por um descuido humano, esse maldito trem bateria, e o impacto do acidente seria desolador. Eu não sabia que aquele seria nosso último abraço, que seria seu último olhar, que eu ouviria pela última vez as suas palavras, sua voz, e guardaria, por fim, aquela imagem triste do seu embarque, após uma discussão infantil de minha parte. Se eu soubesse, meu Deus, tudo teria sido diferente.

quinta-feira, 8 de maio de 2014

#Diário de Klauss - Meu primeiro diário (IV)

    Sabendo disso, foi com aperto no coração que minha mãe alçou a bolsa em mim, entregou-me uma sacola com comida suficiente para a viagem, passou a mão em meu cabelo, com um olhar distante e amargurado. Seu filho de três anos estaria ao cuidado de desconhecidos, mesmo sendo soldados confiáveis e de honra indubitável, a companhia de soldados não era das melhores, eram os que mais sofriam ataques durante a estrada, mais comumente, emboscadas tarde da noite quando paravam para descansar. Mas a viagem era apenas de duas noites, Brosch ficava perto da triangular, então o perigo não era tão eminente.
    Minha mãe me informou que tinha se telecomunicado com meu tio, que ele tinha ficado muito feliz com a notícia. Falou, também, a respeito de meus primos, que tinham poucos anos a mais do que eu, falou sobre o local, da beleza, que era um pouco mais calmo em relação a onde morávamos, uma pequena fazenda, com algumas poucas fazendas ao lado e uma taverna muito frequentada por todo tipo de gente. Advertiu-me, claro, para manter distância da taverna. Contou-me poucas histórias do tempo em que ela vivia lá, das encrencas que tinha que apartar quando trabalhava na taverna, das frutas que ela gostava de colher para preparar uma torta e levar aos seus vizinhos. E rapidamente disse que foi lá, na taverna, que conheceu meu pai, em um dia em que ele estava voltando de uma vigilância. Ela falou rapidamente, como se não quisesse prolongar nesse assunto. E por fim ela disse que não sabia, exatamente, quando voltaríamos a morar juntos, já que depois de Mardora, teria que ir para algumas outras zonas de colheitas, mas que sempre mandaria notícias. Saberia ela depois, que passaríamos dez anos distantes.
    Um soldado bate a porta, fala o nome de minha mãe, esperando que ela confirmasse. Em seguida dá algumas explicações do proceder e informa que estaríamos saindo em poucos minutos. Após ele se retirar, minha mãe olha aos quatros cantos da casa para se certificar que não esqueceu nada, dá o último suspiro, segura minha mão de um lado, a mala do outro e caminhamos pela imensa varanda em direção a um amontoado de gente. Ainda lembro do sol alaranjado se pondo. Aquele frio de tarde, que até hoje me traz lembranças. Apesar de ter apenas três anos, eu sabia da significância do momento, ao menos hoje, entendo ao certo que foi um divisor de águas. Hoje eu paro e penso, se caso nada disso acontecesse, eu não me tornaria o que sou hoje, e sou orgulhoso, a um certo ponto, em detrimento de algumas coisas, do que me tornei. Caso eu continuasse em Brosch, eu seguiria o rumo natural, acabaria cuidando de vaca, ou colhendo arroz. Digo isso, também, por não ter tido um pai que me mostrasse a firmeza no pensamento masculino. Não é uma linha direta, por consequência, é apenas uma dedução. Mas percebendo o rumo que tudo tomou, das vivências que tive, das pessoas que entraram em minha vida desses 3 aos 13 anos, da volatilidade de meus pensamentos, da moldura prostrada, gradativamente, devido a tudo que tive nesse período, muito sensível a qualquer ser humano, fez-me enxergar de maneira, por final, abrupta o despertar do meu eu cristalizado em minha alma. Foram momentos memoráveis, aos quais espero poder passar com precisão, aludindo minha percepção do mundo, desenterrada em forma bruta quando criança, e visando ser perfeita ao passar dos anos.
    Chegamos a dois grupos formados na praça. Em imediato, um soldado chega a minha mãe, troca algumas palavras, olha para mim com um sorriso, como se tivesse querendo ganhar minha confiança, por entender o quão árduo é tal momento para uma criança. Minha mãe diz algumas últimas palavras de despedida, o jovem soldado me pega no colo, eu começo a chorar, mas não como se quisesse chamar atenção, não um choro desesperador, mas um choro de tristeza, apenas. Um choro que minha mãe entendeu, um choro que dizia "vá, eu entendo esse nosso destino, é tudo que podemos fazer, menos o choro controlar". Eu vejo o grupo de minha mãe caminhando, a passos curtos e lentos, se perdendo no horizonte, de tempos em tempos ela se volta e acena para mim. Eu não paro de olhar, como se eu quisesse guardar aquele momento para a eternidade. E foi em um enxugar de lágrimas que tudo se foi, ela partiu e eu fiquei.

quarta-feira, 7 de maio de 2014

Libertação

Após tanto esquecer meu viver
Eu acordo desperto e aflorado
Um tanto aceso, vivaz e amado
Em meu ensejo de um novo ser

Caminho em meu conforto
Passo a passo sem esforço
Descalço na brasa quente
Acalora, coração fervente

Arde o fogo da assolação, 
Mormente no peito
Disco de uma nova canção 
Em tom perfeito
Sopro divino nascente
Ao toque do manto
Que abraça e sente 

Chora no âmago
Consolação o amor divino
Ressurge da libertação 
E prolifera o destino
Sopro divino nascente
Ao toque do manto
Que acolhe e sente.

Em memória de René Cambraia.
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